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Política, fé e realidades virtuais: uma reflexão necessária

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Em 1º de março de 1995, a revista Veja levava a milhares de leitores do Brasil sua matéria de capa: Internet: a rede planetária que você ainda vai se plugar. A reportagem, primorosamente escrita, vaticinava sobre uma verdadeira revolução planetária, crescente e inevitável, que prometia alcançar e transformar as vidas de todos os recantos civilizados do mundo. Anunciava-se um futuro “diferente”, que em pouco tempo, tornar-se-ia o nosso “habitat natural”. Em pouquíssimo tempo, os mais ardorosos céticos renderam-se, inexoravelmente, ao peso da Internet e da realidade virtual.

Não que isto seja bom ou ruim, necessariamente. Os avanços do engenho humano foram sendo potencializados exponencialmente, ao longo da história, graças a cada revolução tecnológica surgida. Assim o foi com o advento, por exemplo, da escrita em papiros e pergaminhos, dos motores a vapor, da eletricidade, da imprensa, dos meios de transporte, das telecomunicações, das técnicas cirúrgicas, dos fármacos, etc. Com tais progressos, não nos imaginamos mais coexistindo em ambiências anteriores a cada transformação científica, o que é normal e desejável. Ninguém quer “andar para trás”. Assim, o sonho tecnológico parece não ter fim. Atualmente, vivenciamos o ápice da vida “on-line”, submersos num mar de possibilidades.

Menos de três décadas se passaram e hoje vemos gigantescas empresas de tecnologia anunciarem que seu fulcro está se voltando para o fomento de uma sociedade digital onipresente, capaz de mesclar espaços de realidade física e virtual, como se fossem um só ambiente, sobrepondo-se uma sobre a outra, de uma forma jamais vista e percebida. Resumindo: a proposta agora é criar um novo mundo (digital) e transportar a pessoa para lá. Esta nova proposta promete revolucionar a educação, a economia, o direito, o comércio, o mercado imobiliário, as artes, o turismo, a indústria da moda, os esportes, etc. Como antes, os céticos também levantam a voz. Contudo, desta vez, em bem menor número.

Isto posto, relevante questão necessariamente se ergue: terá a realidade virtual, fabricada, artificialmente imersiva e sensorial, a capacidade de fazer-nos transportar a um mundo novo, sem fronteiras, patriotismos e governos? Tornar-nos-emos cidadãos digitais? E como será isso? Haverá uma pátria digital? Quem governará este novo mundo? Quem serão os nossos “líderes”? Uma nova sociedade está surgindo. O campo pode até ser digital, mas não deixa de ser social. Como afirma o brocardo latino: Ubi homo, ibi societas (Onde estiverem os homens, haverá a sociedade), e onde há sociedade, há, necessariamente, política. Sendo assim, a quem estaremos vinculados? Quem nos regerá?

Será a virtualidade proposta, plena de nuvens de interconectividade e doses cavalares de tecnologia, capaz de desnacionalizarmos e despolitizarmos? Assim como grandes empresas e marcas famosas do mundo inteiro, nós também, cidadãos comuns, estaremos fadados a migrar para a construção de uma “individualidade dúplice”, metade real, metade avatar? Por mais contraditório que isto possa parecer? A resposta, tudo leva a crer, é um sonoro “Depende”!

Depende do quanto nossas bases materiais e espirituais estejam solidamente alicerçadas na realidade da vida, e não nos sonhos pueris de uma vida dupla de refúgios irreais. Abandonaríamos este mundo, em preferência a outro, mais condizente aos nossos interesses? (Lc 12.34)

Depende do quanto nós tenhamos adquirido uma sã consciência e discernimento do chamado à responsabilidade por nossos atos enquanto seres criados por Deus a Sua Imagem e Semelhança.

Depende do quanto tenhamo-nos blindado, pela via bíblica e eclesiástica, das astutas ciladas de um mundo que jaz no maligno (1 Jo 5.19), que facilmente se desorienta (Mt 15.14), que não consegue se auto governar (Mt 9.36) e que insiste eternamente em construir, impetuosamente, suas torres de Babel (agora virtuais?), passíveis de confusões e algaravias.

Entre inúmeras outras condicionantes. As reflexões não cessam.

Cumpre, portanto, preparar-nos. A questão é real, atual e requererá decisões difíceis de tomar. Seremos cidadãos reais, virtuais ou ambíguos? E quanto à fé: cristãos reais ou virtuais? Como será este “campo missionário”, onde nada existe, senão na “nuvem”, ao sabor de nossas próprias vontades? Deus não nos quer discípulos de interfaces cambiáveis, de dimensões múltiplas e dúbias. Mt 15.8: “Este povo se aproxima de mim com a sua boca e me honra com os lábios, mas o seu coração está longe de mim”.

De igual forma, também nossa cidadania terrestre não admite cidadanias voláteis e flácidas, prontas a serem vencidas por realidades etéreas e mutantes, inconsistentes de tudo. Uma realidade virtual, assim proposta, constrói-se a partir dos desejos e da vontade dos seus idealizadores. Se ao homem é dado ser senhor de seu mundo, logo, este mundo já possui um senhorio. Um novo Éden, inadvertidamente, é o que parece se buscar, um novo paraíso, construído virtualmente, moldado ao talante dos seus idealizadores e construtores, seus governantes naturais. Propõem-se vínculos cada vez mais frágeis com a “realidade real”, a que realmente importa, a qual o Senhor Deus nos incumbiu de dominar, lavrar e proteger. Uma nova ilusão, fabricada por vendedores (e potenciais governadores) de doces possibilidades.

Propõe-se a reflexão, portanto. Não existem, hoje, aqui e agora, respostas simples e prontas. O que existe, sim, é um horizonte límpido e certo de incertezas humanas e de imprescindíveis convicções cristãs. Acredite, isso nunca foi tão necessário!

Que sejamos como os filhos de Issacar, como está escrito em 1 Crônicas 12.32: “destros na ciência dos tempos, para saberem o que Israel deveria fazer”.

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