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Aconselhar é preciso

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Procure salvar quem está sendo arrastado para a morte. Você pode dizer que o problema não é seu, mas Deus conhece o seu coração e sabe os seus motivos. Ele pagará de acordo com o que cada um fizer.
Provérbios 24.11–12 (NTLH)

Você é um conselheiro na comunidade eclesiástica onde está inserido? Dentro do ambiente da igreja, aconselhamento é uma ação voluntária e consensual, desenvolvida por meio de um diálogo pré-estabelecido, dividida basicamente em duas partes fixas com funções e características bem definidas. Uma das partes traz consigo e apresenta questões, dificuldades e problemas, buscando auxílio de uma segunda parte, que é alguém, em que a primeira acredita ter soluções, ajuda, conforto e respostas para seus dilemas. 

Partindo dessa definição, e respondendo minha questão feita anteriormente, penso que todos nós estamos aconselhando pessoas o tempo todo. Nisso eu incluo o aconselhamento silencioso. Sua conduta pode dizer mais que as melhores palavras e os mais ternos abraços de amor fraternal. O aconselhamento silencioso demanda prática. A observação da prática leva a reprodução (ou pelo menos deveria, segundo pesquisadores do campo da psicologia). A reprodutibilidade da conduta de Cristo é o padrão verdadeiro. É enxergar as coisas desse mundo pelas lentes de Jesus. 

Chamamos isso também de cosmovisão cristã. Esta visão traz consigo uma lente corretiva verdadeira, que nos faz perceber o pecado em nós. Essa percepção nos torna seres autoconscientes, demonstrando claramente o que está errado conosco. É uma autoavaliação. Quando iluminamos nosso interior com a luz de Cristo, podemos cortar as raízes do (auto)engano. Estabelecendo nossas bases em um corpo sadio, crescemos juntos em força, graça e espírito. Isso leva à intensa relevância do aconselhamento para a vida cristã cotidiana. Jesus é nossa base, Ele é o centro de tudo. Se o nosso aconselhamento for legitimamente ancorado em Cristo, então sua aplicação há de ser à semelhança dEle. Isso inclui nossas práticas, caráter, compaixão, empatia e amor.

Quando estamos conversando sobre um problema que estamos passando, seja com um irmão em Cristo ou em um gabinete pastoral, as duas pessoas estão buscando prover seu entendimento sobre o que deve ser superado e qual é o padrão normativo bíblico relacionado a isso. O afastamento do padrão bíblico traz o problema. Este afastamento subtrai o elemento divino, colocando em risco a busca de algum senso de como ajudar efetivamente a pessoa a se mover do dilema em sua vida para a solução, solução bíblica.

Como sabemos, a Bíblia não abre negociação. Ela não fala que há muitos caminhos que levam a Deus. Jesus é o caminho, e não um dos. Não só o caminho, mas a verdade e a vida. Assim deve ser a conduta do conselheiro. Independente da minha e da sua convicção doutrinária, eu e você devemos testemunhar, e não convencer ou acusar. Pode ser desafiador entender a distinção complexa dentro da unidade total da igreja. Entretanto, há uma necessidade latente por esse esforço: conhecer os membros do corpo. Quando buscamos conhecer uma parte do corpo, entendemos melhor seu funcionamento global. Este é um desafio ministerial importante posto aos dias de hoje. Aconselhar é conhecer as facetas da alma. É aplicar princípios bíblicos que se aplicam a todas as pessoas em todos os tempos. Também é perceber que isso não nega a demanda de conhecer o indivíduo, suas especificidades. Conhecer a parte do corpo enfraquece o pecado. É tratar o mal pela sua origem, evitando o adoecimento da alma. O pecado adoece e decompõe o corpo.

Jesus aconselhou e falou a verdade em amor às massas não negando suas identidades individuais, Ele considerou as identidades únicas de cada um. Ele sopesou suas particularidades, contextos, necessidades físicas, ambientes sociais. A Palavra permanece reta, entretanto, nossos esforços devem ser multiformes. Os conselheiros cristãos precisam aferrar-se à Palavra Sagrada para compreender, exaustivamente, seus aconselhados para, dessa forma, ministrar-lhes com dedicação e compaixão.

Nossa prática de aconselhamento requer um conhecimento nanométrico da semente imperecível e permanente, a Palavra de Deus. A mensagem da Bíblia é para ser entendida e compartilhada, e não retida. Não compartilhar a Palavra é como reter um tesouro e tomar prejuízo. É como ter uma fruta saborosíssima e vê-la apodrecer sem tê-la aproveitado. Como conselheiros devemos agraciar nossos aconselhados com o Evangelho genuíno, que traz amor, mas também confrontamento. E para isso precisamos ter coragem.

O Evangelho não é para covardes. Jesus disse que os covardes não entrarão no Reino dos Céus. Apenas aquele que vencer – não aquele que será vencido -, entrará no Reino dos Céus. Na versão NVI da Bíblia Sagrada, o termo “vencedor” quer dizer “aquele que passou por situações de guerra, luta ou competição”. Por isso Paulo chamou a vida cristã de COMBATE, CORRIDA, como está em 2 Tm 4.7. Precisamos romper as barreiras e vencer as limitações espirituais intercorrentes ao nosso ministério, diariamente. 

Carecemos perceber que nossa condição espiritual de hoje não é necessariamente indicativa da condição espiritual de amanhã. Nossa condição espiritual influencia diretamente no ministério do aconselhamento. Precisamos estar constantemente em guarda para evitar uma possível deterioração espiritual e moral. Mas, motive-se! Deus nos fornece uma lista encantadora de promessas para os vencedores (Ap 2.7,11, 17, 26; 3.5 e 12; 21.7). 

Volvendo um pouco, há tempo, quem são os covardes? São aqueles que conhecem a Verdade, entretanto, por conveniência sacrificam-na por medidas imediatistas e ilusórias. Negligenciam seu papel eclesial por se apoiarem em si, topando de fronte com suas limitações humanas. São aqueles que não consolam os desacreditados e nem olham para os improváveis, adornados por uma compaixão hibernante e raso conhecimento de Deus. São aqueles que jogam migalhas àqueles que precisam de um banquete. Para ser um bom conselheiro cristão precisamos transformar a matéria-prima proveniente das nossas naturais limitações em ação ao próximo. Pensando sobre isso, lembro-me que certa vez ouvi dos lábios do Rev. Hernandes Dias Lopes a seguinte frase: “Deus converte nossas dores, nossos lamentos e angústias em fonte de consolação para as pessoas.” Precisamos transformar nossos desafios mais profundos em matéria-prima para um aconselhamento acabado, maduro e completo. É uma alegria experimentar o resultado de um aconselhado, percebendo Deus e seus bons propósitos.

Para aconselhar um irmão em Cristo necessitamos lavar as mãos na retidão, no aprazimento. Precisamos confiar no Senhor e não em nós mesmos, pois a centralidade está no Eterno. Precisamos entender profundamente nossas particularidades, cada qual por seu turno, encarando uma concepção verdadeira, excluindo a poeira da alienação espiritual e de si próprio.  Como conselheiros e portadores de uma vultosa responsabilidade, é contumaz que reconheçamos quando nossa vida está em meio a desafios ou em um desfiladeiro, que causa medo e insegurança. Em momentos assim, agarro-me manifestamente aos pés de Jesus, reconhecendo a minha impossibilidade e inépcia diante dEle, pois eu sei que na minha limitação evidencia-se o poder de Deus. 

O aconselhamento não é um rudimento desorganizado. Requer dedicação e preparação. Não é um elemento fracionário, dispensável. É parte-chave do todo. Precisamos de atitudes totais e não casuais. Não seja parcial naquilo que você é fundamental. Meias palavras podem denotar fraca união espiritual de amor e compassividade. Não acolher aquele que precisa de uma palavra santa equivale a expressão francesa “Je m’en fiche” (Não me importo! Não estou nem aí!), que ordinariamente sairia da boca de Voltaire. Portanto, caríssimos irmãos, como Vírgilio diria, “in utrumque paratus” (prontos para o que vier; prontos para o que aparecer). Precisamos estar preparados para um aconselhamento piedoso e eficaz. Aconselhar é como atravessar um novo caminho a cada dia. É ser convidado para uma viagem, sendo conduzido por Deus. Flerte com o conhecimento de Deus e não com a falsa suficiência humana. A suficiência humana engana, usurpa. Refletindo sobre isso, apoio-me na frase de Santo Agostinho, que diz assim: “Senhor, se formos enganados, sê-lo-emos por ti”. 

Amado Deus e Eterno Pai, que nosso ministério seja bordejado pela clareza e conhecimento das suas Escrituras, para que eu não me apoie no diapasão frívolo da minha própria vontade. Que minhas palavras sejam uma costura evangelística com pontos firmes. Não permita, Senhor, que eu use a medida do meu próprio pulso. Em nome de Jesus eu oro, amém e amém.

*Texto referente à ministração realizada em junho de 2022, na Academia Evangélica de Letras do Brasil.

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