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Por que sou objetor de consciência?

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Vivemos em uma democracia. Isso é muito bom. Apenas 7,8% da população vive em “democracias plenas”. A EIU (Economist Intelligence Unit) alertou para a regressão da democracia no mundo. Em estudo publicado no mês passado (fevereiro de 2024), a divisão de pesquisa do Grupo Economist afirmou que, em 2023, seu Índice de Democracia atingiu o nível mais baixo desde 2006, quando a análise começou a ser desenvolvida[i]. Os dados sugerem uma tendência geral de regressão e estagnação [da democracia] nos últimos anos”, afirmou o estudo[ii].

Na democracia em que vivo me é permitida uma série de liberdades e direitos que não se encontram em nenhum outro lugar no mundo. Moro no Ocidente, para minha sorte. Mas não foi por sorte que chegamos até aqui. Foram as bases do direito romano, somadas ao modelo judaico-cristão, que permitiram o desenvolvimento de nossa civilização. 

Se tivemos a carta dos direitos humanos ou a revolução científica, foi graças a esse modelo. E é sobre a liberdade que temos como cidadãos ocidentais que vou discorrer nesse texto. Sou médico ginecologista e obstetra, vivo e trabalho em Portugal e sou cristão. Um dos temas mais delicados que temos na minha área de atuação é o aborto. 

Anunciado como direito das mulheres, o aborto apresenta tendência de aumento em Portugal pela primeira vez em 12 anos.  A DGS – Portugal diz que esse aumento está “em linha com a tendência noutros países da União Europeia”. Ao contrário daquilo que tem vindo a acontecer desde 2011, com uma diminuição do número de interrupções voluntárias de gravidez, no ano passado os registos voltaram a aumentar. Segundo o Relatório de Análise dos Registos das Interrupções da Gravidez publicado no final de 2023, foram realizadas 15.870 interrupções voluntárias da gravidez, um aumento de 15% face a 2021[iii].
O relatório afirma ainda que a interrupção da gravidez por opção da mulher nas primeiras 10 semanas manteve-se como principal motivo em todas as idades (96,4%), adiantando que doença grave ou malformação congénita do nascituro motivou 543 IVG (3,3%). Em outras palavras, apenas 3% dos casos de interrupção foi por indicação de doença grave do feto. Foram mais de 96% dos casos por opção ou desejo da mulher. 

Não está em debate aqui a liberdade da mulher, afinal é graças à nossa cultura ocidental que chegamos ao nível de escolha e liberdade em que estamos hoje, mas quero elevar o debate para que essa liberdade seja utilizada da forma mais prudente, segura e racional possível, de forma também a valorizar a vida, seja da mulher ou do feto. Como democracias plenas prezamos pelos direitos de todos, independente de status social ou religioso, etnia ou país de nascimento, lutamos pela igualdade, liberdade, fraternidade, inclusive dos reclusos e presos. 

A pena de morte foi erradicada na União Europeia[iv]. Estamos em avançado estágio de desenvolvimento humano, com boas escolas e hospitais bem estruturados. Então por que utilizar-se do feticídio como método contraceptivo?! Se prezamos tanto a vida, por que desvalorizá-la ou relativizá-la em seu estágio mais inicial e frágil? 

Pelos dados acima expostos fica claro que a maior parte das interrupções da gravidez são utilizadas exclusivamente como método contraceptivo. Isso reflete não uma falha de caráter da mulher ou dos profissionais de saúde, mas antes uma falha muito maior, coletiva, do sistema social, que prioriza a morte do feto em prol de inúmeras outras opções contraceptivas de forma a relativizar nosso bem maior nessa terra, a vida.  Enquanto em outras nações onde ainda existem pena de morte, apedrejamento, desrespeito aos direitos das mulheres e o terrorismo é uma constante, as populações continuam a crescer, na Europa enfrenta-se uma grave crise demográfica, com a população europeia a diminuir. Em 2070 estima-se que deverá rondar os 4% da população mundial, comparada com os 6% registados atualmente. 

O argumento da gravidez fruto de uma violação (estupro) torna a exceção em regra e relativiza o direito à vida do homem. Nossa liberdade vai até onde começa o direito do outro. E por que o feto não é “outro”, afinal todos nós estivemos nesse estágio de desenvolvimento? O feto não é apenas “outro”, mas simboliza “todos”, em nossa forma mais inicial, mas pulsante como vida, habitando dentro de nossas mães, sem distinção de raça, cor, crença ou classe social num ambiente que deveria ser o mais seguro de se estar e não o mais perigoso. Os fetos são os mais iguais dos seres humanos e precisamos valorizá-los como tal.


[i] (https://www.poder360.com.br/internacional/democracia-atinge-nivel-mais-baixo-desde-2006-diz-economist/)

[ii] https://static.poder360.com.br/2024/02/estudo-indice-de-democracia-2023-economist.pdf 

[iii] https://observador.pt/2023/10/16/numero-de-abortos-aumenta-pela-primeira-vez-em-12-anos/

[iv] https://www.consilium.europa.eu/pt/press/press-releases/2023/10/09/european-and-world-day-against-the-death-penalty-10-october-2023-joint-statement-by-the-secretary-general-of-the-council-of-europe-and-the-high-representative-on-behalf-of-the-european-union/

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