Escuridão. Ela chega mesmo após um lindo dia de sol. Vem trazendo silêncio, pavor, insegurança, dor.
O corpo doente sofre mais. A voz rouca quase se cala. A febre parece se fortalecer da noite e alucina quem já mal se aguenta. O choro é baixinho, escondido no travesseiro já molhado. O coração se quebra em mais pedaços e não há quem junte seus cacos. Todos dormem. Talvez ninguém se importe.
O coração sente que logo ali há um precipício. Nas sombras, ninguém o pode ver, e é tão profundo e largo! Vai-se tateando, passo a passo, na esperança de evitá-lo. Quem pode correr quando só há escuridão? Mas a inquietude da alma não permite sossegar para esperar a noite passar. É tanta pressa! É o desejo desesperado de ver o romper da alvorada, mas minutos parecem infinitas horas que se eternizam em lamento. De repente, já na beira do penhasco, já perdendo a razão, uma voz irrompe no peito, quase perceptível aos ouvidos: Entrega tudo a Mim!
A dúvida lampeja no dolorido coração: Tudo? Não sobrou nada! Há somente dor, horror, uma vida aleijada pelas batalhas perdidas.
Mas, de novo no peito ecoa: Entrega a Mim!
Já cansado o corpo desmonta, encontrando o frio chão. Ali prostrado compreende: Tudo! Tudo o que consome, que machuca, que enfurece, que faz definhar os sonhos. Tudo que rasga o coração e perturba a mente. Tudo que paralisa de medo ou lança em armadilhas mortais. Tudo o que restou, esse fio de vida que parece nada.
Braço estendido, corpo rendido. Não é manhã ainda, mas de súbito a escuridão se dissipa e dá lugar à mais resplandecente Luz, tão gloriosa que mal se pode abrir os olhos, tamanho o Seu fulgor. Mas não apenas brilha, também aquece e traz conforto.
Escuridão, dor, pavor já não há, somente um silêncio calmo. Nunca foi tão gratificante estar rendido.