“Eu sou a ressurreição e a vida; quem crê em mim, ainda que morra, viverá” (Jo 11.25). Essa declaração imensa de Jesus nasce no terreno comum da expectativa frustrada. Marta e Maria tinham enviado o recado apressado: “Senhor, eis que está enfermo aquele a quem amas”. A amizade era antiga, a mesa era conhecida; Jesus se hospedava naquela casa. Tudo indicava que Ele viria imediatamente. Mas Ele não veio. Lázaro morreu. E, com ele, quase morreu também a confiança de duas mulheres que amavam o Senhor. Quando Jesus finalmente chega a Betânia, o texto registra um contraste discreto e profundo: “Marta, quando soube que Jesus vinha, saiu ao seu encontro; Maria, porém, ficou assentada em casa” (Jo 11.20). Uma corre, a outra paralisa. Na boca de Marta, não há protocolo: “Senhor, se estivesses aqui, meu irmão não teria morrido” (v. 21). É a decepção que se converte em oração sincera. E é exatamente aí que a cura começa.
Decepção é o intervalo entre o que esperamos e o que recebemos. Esperamos a cura e recebemos o luto; esperamos a promoção e veio o corte; esperamos reconciliação e encontramos silêncio. A pergunta invade o coração: como uma casa visitada por Jesus pode ser atravessada por enfermidade? A Escritura é realista: a chuva e o sol alcançam justos e injustos; a diferença não é a ausência do vale, mas quem caminha conosco dentro dele. A presença de Cristo não é um seguro contra dores, é a promessa de sentido, caminho e desfecho. João faz questão de dizer que “Jesus veio a Betânia”. Não chegou na hora que as irmãs desejavam, mas chegou no tempo certo. A demora divina não é descaso; é pedagogia. Enquanto as perguntas fermentam dentro de casa, Ele está a caminho. E quando chega, não exige que Marta finja força; Ele acolhe a fala ferida e responde: “Teu irmão há de ressuscitar” (v. 23). Primeiro acalma, depois reorienta.
Há um momento decisivo em Marta. Ela sai do “se” para o “agora”: “Mas também agora eu sei que tudo quanto pedires a Deus, Ele te concederá” (v. 22). A fé amadurece quando permite que Deus transforme “nunca” em “agora”. Muitos de nós já vivemos “agoras” que um dia juramos que seriam “nuncas”: o casamento que parecia impossível, o filho que não viria, a porta que nunca se abriria. A presença de Jesus altera o tempo: o Cristo que imaginávamos agir apenas “ontem” — se Ele estivesse ali — ou “amanhã” — na ressurreição final — se apresenta como “hoje”. Por isso, antes do milagre no túmulo, há um milagre na teologia de Marta: suas categorias são alargadas, sua esperança é trazida para o presente, sua dor ganha gramática nova. A oração que desabafa se torna ponte para a confiança que descansa.
A narrativa ensina que o caminho da cura envolve passos simples e custosos. É preciso levantar-se e ir ao encontro, mesmo com o coração pesado. É preciso falar com Deus com a verdade que temos, sem verniz devocional: “Se estivesses aqui…”. É preciso permitir que a resposta de Jesus substitua nosso refrão cansado pelo nome dEle: “Eu sou…”. É preciso aceitar que milagres divinos e responsabilidades humanas caminham juntos: Ele brada “Lázaro, vem para fora!”, mas ordena à comunidade: “Desatai-o e deixai-o ir” (v. 44). O Cristo chama para a vida; nós ajudamos a desenrolar as faixas, com oração, conselho, terapia, disciplina, limites. Ressurreição não é retorno ao antigo; é vida nova aprendendo a andar.
Esse texto se torna contemporâneo quando Deus “demora”. Nem sempre a intervenção coincide com nosso cronograma, e isso fere nossa expectativa de controle. Mas há uma lógica graciosa na economia do Céu: às vezes Ele não cura o enfermo, porque vai ressuscitar o morto. O milagre é maior, e por isso a espera é mais longa. Em dias assim, a tentação é ficar “sentado em casa”, paralisado pelas hipóteses do coração. A cura, porém, começa na estrada: ir ao culto mesmo sem vontade, abrir a Bíblia quando as letras parecem pesadas, dobrar os joelhos quando a mente quer desistir. A presença se revela para quem caminha.
No centro de João 11 está a voz que reconfigura tudo: “Eu sou a ressurreição e a vida”. Nenhum líder, por mais inspirador, pode dizer isso. Nenhum sábio, por mais lúcido, ousou prometer tanto. Jesus não oferece apenas consolo; Ele se oferece como a própria Vida que vence a morte. Diante dessa voz, a decepção perde argumento. O Cristo que não chegou “no nosso horário” chega como Senhor do túmulo, chama pelo nome, devolve gente à vida e manda tirar as faixas. Ele sabe o tempo, conhece a casa, mede o vale e garante o desfecho. Se há uma pedra ainda no lugar, empurre com esperança. Se as faixas ainda prendem, peça mãos fiéis para ajudá-lo a desenrolar. Se o peito está pesado, diga a Ele como está — e ouça o que Ele é. No tempo certo, o mesmo Jesus que caminhou para Betânia caminha na sua direção. E, quando Ele chega, até a morte perde a última palavra.